SOMENTE DE REGATA E CALCINHA
Saí do trabalho apressada. Cheguei em casa correndo. Passei antes na pequena mercearia da esquina. Comprei algumas batatas para fazer com carne cozida.
Tirei a blusa do trabalho e vesti uma regata confortável. Mantive o jeans. O dia estava frio e ele não era mais tão novo. Poderia, então, ser usado também durante a arrumação da casa.
Iniciei o almoço. Enfiei a carne temperada de véspera na panela de pressão para apressar o cozimento. Enquanto isto iniciei o preparo das batatas em outra panela. Reservei tomate picado e cebola para acrescentar à carne, juntamente com as batatas.
Quando estava lavando o arroz, Patrícia entrou na cozinha. Pensei:
__ Lá vem interrogatório. __ Dito e feito. Na verdade ela não fez simplesmente uma pergunta:
__ Você está fazendo carne moída de novo? __ Criticou, fazendo referência ao dia anterior, quando preferiu trocar a carne por um ovo. Irritada, respondi:
__ Não senhora. É carne cozida. __ E antes mesmo que eu iniciasse meu rosário de explicações sobre a necessidade de evitar frituras e bifes, ela falou:
__ Oba! Carne cozida?
__ Sim, filhinha! Igual à carne que a vovó Helena faz. Você gosta? __ Perguntei admirada e me sentindo ignorante quanto ao gosto alimentar dela.
__ Gosto mãe. Aprendi a gostar. __ Ela respondeu ao mesmo tempo em que balançava os braços de um lado pro outro.
__ Ah! Bom! __ Afinal eu não estava tão desinformada assim. __ Aprendeu a gostar. Ainda bem. __ Pensei em voz alta.
Ela retornou à sala. Avisei que não demoraria muito. Pensei na reclamação que viria de Marina, mas já estava preparada. Diria apenas:
__ Vai comer o que tem. Se não quiser, fique com fome, mas não pense que eu arrumarei algum lanche antes de 15 horas. Não precisa nem pedir pra eu ir à padaria comprar qualquer coisa, pois eu não vou.
Marina não apareceu. Senti um grande alívio quando terminei de fazer o almoço e soube que ela estava dormindo. A reclamação viria mais tarde e enquanto isto, eu poderia almoçar em paz junto com Patrícia.
Patrícia repetiu a carne cozida. Terminamos o almoço.
__ Quando esta menina passou a gostar de carne cozida que eu não me lembro? __ Pensei admirada.
Lavei os pratos, copos e talheres. Coloquei pra escorrer. Escorredor é tudo de bom: adia por um tempo, a chatice de guardar as vasilhas. Mantive as panelas no fogão pra esquentar o almoço, quando Marina acordasse.
Terminei a primeira parte da arrumação da cozinha. A parte chata faria somente à noite, depois de tudo terminado.
Fui pra fora da casa concluir o serviço que havia começado na véspera. Lavei todo o quintal com a ajuda de dois baldes. Minha casa é enorme: lote padrão de 360 m² com praticamente toda a área construída, exceto um pequeno espaço de 4 por 2 metros de terra, mais ou menos,que seria futuramente um jardim.
Jogar água, ensaboar e enxaguar um quintal como o meu, já valem por dois dias de trabalho. Antes disto, lavei a casa da cachorra. Joguei desinfetante e sequei o chão com o pano reservado pra isto. Recoloquei o tapete. Ordenei, com expressão de vingança, que ela entrasse na própria casa. Ficaria ali dentro até sábado à noite. Castigo pela bagunça de fezes e urina que promoveu no quintal inteiro. Não pude evitar um sorrisinho de vitória quando ela, humilde, com o rabinho entre as pernas, passou por mim e entrou na casinha. Fechei o portão e lavei o quintal. Durante o trabalho, puxei várias vezes meu jeans até a cintura.
__Engraçado, o jeans não me incomodou de manhã na escola! Estava até apertadinho... Calça mais chata! __ Pensei, no momento em que a arrumava pela milésima vez.
Depois da arrumação do lado de fora, passei pano de chão em quase todos os cômodos. Como eu já tinha varrido a casa no dia anterior bastou passar o pano duas vezes em cada parte. Lembrei que essa é a forma correta de prevenir alergias a poeiras domésticas. Conversa de alergista. Apesar de achar essa solução porca demais, fiz o trabalho com a consciência tranquila.
E passei pano sem parar. Quarto, que foi um dia de casal, valendo por dois de tão grande; mais dois quartos de solteiros, um pequeno quartinho de passar roupas e uma sala enorme para dois ambientes. Em seguida, lavei a copa, a cozinha e a pequena área de lavanderia. Deixaria a poeira dos móveis pra remover no dia seguinte. O trabalho com as vasilhas seria adiado também.
Eu estava exausta. Não havia lanchado. Aceitei sem discutir o fato de Marina não ter almoçado. Será que o motivo foi a carne? Dei de ombros. Eu não saberia também dizer o que Patrícia e Marina comeram durante a tarde.
Bastante cansada, lavei os fundos das gaiolas dos passarinhos. Troquei a água e o alpiste. Já eram 19 horas quando eu amarrei as bocas dos sacos de lixo para levá-los até a rua. O lixeiro passaria no sábado de manhã. Colocando na rua à noite, eu não precisaria levantar cedo no dia seguinte.
Enquanto fechava o lixo, constatei o que pra mim não passava de um mito: trabalho doméstico queima mesmo calorias. Distraída e cansada, amarrando os plásticos, fui dar pelo meu jeans, quando ele já estava caído até metade das minhas coxas.
Eu ali no frio. Somente de regata, calcinha e jeans descendo pelas pernas abaixo.
Concluí que estava mais magra de tanto faxinar minha casa. Mas infelizmente, com a mesma gordurinha localizada na cintura.
Ana Paula Costa
Contagem, 24 de agosto de 2013.